
História da Igreja é a história da sua missão.
A obra de Paulo
A índole de Paulo era tão múltipla que é preciso considerar a sua
obra sob diferentes aspectos:
- O propagador do Evangelho: Uma consulta aos mapas de suas viagens
indica o avanço do Evangelho através de sua pregação ao longo do
semicírculo que vai de Antioquia a Roma. Paulo adotou como principio
básico a expansão do Evangelho para o Ocidente e é encantador o fato de
ter alcançado seu objetivo, Roma, embora, fosse, então, prisioneiro do
governo romano.
Ele iniciava seu trabalho nos centros romanos estratégicos indo primeiro
as sinagogas, onde pregava sua mensagem enquanto fosse bem recebido.
Quando surgia a oposição, ele partia para a proclamação direta
do Evangelho aos gentios em qualquer lugar que julgasse adequado. Seu
princípio era pregar aos gentios depois de ter pregado aos judeus. Depois
de fundar uma igreja, Paulo a organizava com presbíteros e diáconos a
fim de que o trabalho continuasse após sua partida.
Estes princípios seguidos pelo apóstolo serviram-lhe no desenvolvimento
das igrejas como centros organizados para continuação da pregação
do Evangelho. Ele não as deixou sem ajuda constante, pois usava
revisitar as igrejas que fundava, a fim de encorajá-las e fortalecê-las (At
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15:36). Não é de admirar o rápido crescimento do cristianismo sob esta liderança
sadia e inspirada.
- As publicações de Paulo: Paulo adotava a prática de se manter em
contato com a situação local em cada igreja através de visitadores (I Co
1:11). Quando a situação local parecia exigir ele escrevia cartas sob a inspiração
do Espírito Santo para tratar dos problemas particulares. Deve-se,
ainda, atentar para o fato de que todas as cartas surgiram de uma crise histórica
definida em alguma das amadas igrejas de Paulo. As epístolas são
ainda hoje de grande valor para qualquer igreja na solução de seus problemas.
Paulo sempre equilibrou formulas teológicas com aplicação prática.
- Os princípios da teologia de Paulo: A educação de Paulo no lar, na
sinagoga e com Gamaliel; sua observação da natureza (Rm 1:19-20); sua
experiência de conversão; sua mente criativa, e, acima de tudo, a revelação
divina, foram importantes no desenvolvimento de sua teologia. O sistema
ético de Paulo desenvolve-se a partir da união pessoal do crente com Cristo
pela fé. Esta relação vertical deve ser completada com uma relação horizontal
na qual o crente se une aos irmãos pelo amor cristão expresso numa
vida moral (I Jo 3:23: Ef 1:15). Nem o legalismo do judaísmo, nem o racionalismo
do estoicismo, mas o amor cristão deve ser a fonte da conduta
cristã. Esta vida de amor envolve separação da corrupção pessoal que vem
da adoração de ídolos, da impureza sexual ou da embriaguez – os grandes
pecados do paganismo.
- Paulo como polemista: Paulo jamais se contentava em simplesmente
apresentar o cristianismo. Ameaças à pureza da doutrina cristã levavamno
a luta contra o inimigo. Nenhuma interpretação falha da pessoa ou da
obra de Cristo escaparam a sua condenação, nem deixou de tentar convencer
os errados a voltarem a fé. Os acontecimentos do Concílio de Jerusalém.,
revelaram a tenacidade de Paulo quando uma questão fundamental
estava em jogo. Ele estava pronto para fazer concessões secundárias, desde
que isto facilitasse seu trabalho; mas não permitiu a circuncisão de Tito em
Jerusalém porque a liberdade gentílica quanto a observância da lei ritual
judaica era o princípio pelo qual lutava. A liberação do cristianismo da observância
da lei cerimonial judaica foi o resultado de maior alcance do
Concílio. A partir daí, a fé permaneceu como único meio pelo qual o homem
alcança a salvação.
Paulo enfrentou também o desafio do racionalismo grego quando lu20
História da Igreja
tou contra um gnosticismo incipiente na igreja. Alguns homens procuravam
intelectualizar os meios da salvação assim como os cristãos judeus
tinham tentado legalizá-los. O gnosticismo (falaremos mais sobre este assunto)
tornou-se um perigo especial na igreja colossense. Paulo respondeu
a esta heresia pela afirmação irrestrita da total suficiência de Cristo
como criador e redentor (Cl 1:13-20). Cristo é a plena manifestação de
Deus e não é de forma alguma inferior a Deus (Cl 1:19; 2:9). Não surpreende
que Paulo, com esta fé, com esta coragem e com uma sólida
perspectiva de sua tarefa, tenha sido capaz de levar a mensagem da salvação
às nações gentílicas do Império Romano e fincar a cultura cristã na
sua triunfante caminhada ocidental pela Europa.
A organização da igreja primitiva
A igreja existe em dois níveis. Um deles é um organismo eterno,
invisível, bíblico, que é consolidado em um corpo pelo Espírito Santo. O
outro nível é o da organização temporal, histórica, visível, humana. O
primeiro é o fim, o segundo os meios. O desenvolvimento da Igreja como
uma organização foi iniciado pelos apóstolos sob a direção do Espírito
Santo. Todo corpo organizado precisa da divisão de funções e a especialização
da liderança para que possa funcionar eficientemente. Uma liturgia
para conduzir o culto da igreja de modo ordenado (I Co 14:40) é outra
conseqüência lógica do crescimento da igreja como organização. O objetivo
final da igreja como um organismo que cultua é a conquista da qualidade
de vida.
O governo
A origem da administração eclesiástica deve ser creditada a Jesus,
ao escolher os doze apóstolos que seriam os líderes da igreja nascente. Os
apóstolos tomaram a iniciativa no desenvolvimento de outros ofícios na
Igreja quando dirigidos pelo Espírito Santo. Isto não implica numa hierarquia
piramidal, como a desenvolvida pela Igreja Católica Romana, porque
os novos oficiais deviam ser escolhidos pelo povo, ordenados pelos
apóstolos e precisavam ter qualificações espirituais próprias que envolviam
a subordinação ao Espírito Santo. Assim, havia um chamado interno
pelo Espírito Santo para o oficio, um chamado externo pelo voto demoSemeador
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crático da igreja e a ordenação ao oficio pelos apóstolos. Não deveria haver
uma classe especial de sacerdotes à parte para ministrar o sistema sacerdotal
da salvação, porque tanto os oficiais da igreja como os membros
eram sacerdotes com o direito de acesso direto a Deus através de Cristo
(Ef 2:18)
Estes oficiais podem ser divididos em duas classes. Os oficiais carismáticos
(charisma em grego significa dom) foram escolhidos por Cristo e
revestidos com dons espirituais próprios (Ef 4:11-12; I Co 12-14), suas
funções eram basicamente inspirativas. Os oficiais administrativos constituíam
a segunda classe, suas funções eram principalmente administrativas,
embora após a morte dos apóstolos os presbíteros tenham assumidos muitas
responsabilidades espirituais.
- Oficiais Carismáticos: Estes homens, cujas responsabilidades eram
a preservação da verdade do Evangelho e sua proclamação inicial, foram
selecionados especialmente por Cristo através do Espírito Santo para exercer
a liderança da igreja. Os apóstolos eram homens que tinham sido testemunhas
da vida, morte e principalmente da ressurreição de Cristo (At
1:22; I Co 1:1;15:8), e que tinham sido chamados pessoalmente por Cristo.
Paulo baseou seu apostolado num chamado direto do Cristo vivo. Estes
homens, que foram os primeiros oficiais da igreja primitiva, combinaram
em seu ministério todas as funções posteriormente exercidas por vários oficiais
quando os apóstolos se tornaram incapazes de cuidar das necessidades
da igreja primitiva em rápida expansão.
- Oficiais Administrativos: Eram democraticamente escolhidos “com
o consenso de toda igreja”. Sua tarefa era executar as funções administrativas
dentro da igreja local. Estes oficiais surgiram com a divisão de funções
e a especialização necessárias para ajudar os sobrecarregados apóstolos diante
de uma igreja em crescimento. O ofício do ancião ou presbítero era o
mais elevado na congregação local. Os diáconos tinham uma posição de subordinação
aos anciãos, mas aqueles que exerciam tal função precisavam
das mesmas qualidades exigidas dos presbíteros (At 6:3; I Tm 3:8-13). A
prática de eleição democrática era também uma recomendação dos apóstolos
em Jerusalém (At 6:3,5). A ministração da caridade pela igreja era a
principal tarefa dos diáconos.
Mais tarde, eles ajudaram os presbíteros na distribuição dos elementos
da Ceia à congregação. As mulheres parecem ter sido admitidas a este
oficio nos tempo apostólicos, pois Paulo menciona a diaconisa com aprovação
(Rm 16:1).
O culto
A questão de uma forma segura de culto parece ter sido uma preocupação
ao tempo dos apóstolos. Paulo exortara a igreja a conduzir sua
adoração de uma forma decente e ordeira (I Co. 14:40). Os cristãos primitivos
não concebiam a igreja como um lugar de culto como se faz hoje.
Igreja significava um corpo de pessoas numa relação pessoal com Cristo.
Para tanto, os cristãos se reuniam em casas (At 12:12; Rm 16:5,23; Cl
4:15; Fm 1-4), no templo (At 5:12), nos auditórios públicos das escolas
(At 19:9) e nas sinagogas até quando foram permitidos (At 14:1,3 17:1;
18:4). O lugar não era tão importante como o propósito de encontro para
comunhão uns com os outros e para culto a Deus. A Ceia do Senhor e o
batismo eram os dois sacramentos da igreja primitiva, usados por terem
sido instituídos por Cristo.
O convívio social
A igreja primitiva insistia na separação das práticas pagãs da sociedade
romana, mas não insistia na separação dos vizinhos pagãos em relações
sociais que não fossem prejudiciais. Realmente, Paulo permitiu por
inferência o convívio social que não comprometesse ou sacrificasse os
princípios cristãos (I Co 10:20-33). Ele mesmo exortou, porém, à separação
total de qualquer prática que pudesse estar relacionada à idolatria ou
à imoralidade pagã. O cristão devia seguir os princípios de não fazer nada
que prejudicasse o corpo do qual Cristo era Senhor (I Co 6:12) e deveria
evitar tudo que não glorificasse a Deus (I Co 6:20; 10:31). Estes
princípios proibiam a freqüência a teatros, estádios, jogos ou templos pagãos.
Apesar desta atitude de separação moral e espiritual, os cristãos estavam
prontos para, como o próprio Paulo exortou, cumprir suas obrigações
cívicas de obediência e de respeito às autoridades constituídas, pagamento
de taxas e de oração pelas autoridades (Rm 13:7, I Tm 2:1-2).
Eles eram excelentes cidadãos, desde que não fossem instados a violar
os preceitos de Deus, a maior autoridade a quem deviam obediência
absoluta.
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Com relação ao convívio entre os cristãos, temos um relato em Atos
2: 42-46, do seu modo de viver: “E perseveravam na doutrina dos apóstolos
e na comunhão, no partir do pão e nas orações”.
A pureza da vida, o amor e a coragem da igreja primitiva em permanecer
fiel, e morrer se necessário, exerceram um forte impacto sobre a sociedade
pagã da Roma imperial, o que durou três séculos, desde a morte de
Cristo até o reconhecimento oficial por Constantino da importância do cristianismo para o Estado. à pureza da doutrina cristã.