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A IGREJA MEDIEVAL

 SEXTA PARTE

 

  Início da Reforma Religiosa.

  A Queda de Constantinopla.

  Eruditos e Dirigentes

 

Durante este período, especialmente seu ocaso, manifestaram-se réstias de luz religiosa, presságios da futura Reforma. Cinco grandes movimentos de reformas surgiram na igreja; contudo, o mundo não estava preparado para recebê-los, de modo que foram reprimidos com sangrentas perseguições.

Os albigenses ou cátaros (cathari), "puritanos", conseguiram proeminência no sul da França, cerca do ano 1170. Eles rejeitavam a autoridade da tradição, distribuíam o Novo Testamento e opunham-se às doutrinas romanas do purgatório, à adoração de imagens e às pretensões sacerdotais, apesar de terem algumas idéias estranhas relacionadas com os antigos maniqueus, e rejeitarem o Antigo Testamento. O papa Inocêncio III, em 1208, mobilizou uma "cruzada" contra eles, e a seita foi dissolvida com o assassínio de quase toda a população da região, tanto a católica como a herege.

Os valdenses apareceram ao mesmo tempo, em 1170, com Pedro Valdo, um comerciante de Lyon, que lia, explicava e distribuía as Escrituras, as quais contrariavam os costumes e as doutrinas dos católicos romanos. Pedro Valdo fundou uma ordem de evangelistas, "os pobres de Lyon", que viajavam pelo centro e sul da França, ganhando adeptos. Foram cruelmente perseguidor e expulsos da França; contudo encontraram abrigo nos vales do norte da Itália. Apesar do séculos de perseguições, eles permaneceram firmes, e atualmente constituem uma parte do pequeno grupo de protestantes na Itália.

João Wyclif iniciou um movimento na Inglaterra a favor da libertação do domínio do poder romano e da reforma da igreja. Wyclif nasceu em 1324, educou-se na Universidade de Oxford, onde alcançou o lugar de doutor em teologia e chefe dos conselhos que dirigiam aquela instituição. Atacava os frades mendicantes e o sistema do monacato. Recusava-se a reconhecer a autoridade do papa e opunha-se a ela na Inglaterra. Escreveu contra a doutrina da transubstanciação, considerando o pão e o vinho meros símbolos. Insistia em que os serviços divinos na igreja fossem mais simples, isto é, de acordo com o modelo do Novo Testamento. Se ele fizesse isso em outro país, certamente teria sido logo martirizado. Porém, na Inglaterra, era protegido pelos nobres mais influentes. Mesmo depois que algumas de suas doutrinas foram condenadas pela Universidade, ainda assim lhe foi permitido voltar à sua paróquia em Lutterworth, e a continuar como clérigo, sem ser molestado. Seu maior trabalho foi a tradução do Novo Testamento para o inglês, terminado em 1380. O Antigo Testamento, no qual foi ajudado por alguns amigos, foi publicado em 1384, ano de sua morte. Os discípulos de Wyclif foram chamados "lolardos", e chegaram a ser numerosos. Porém, no tempo de Henrique IV e Henrique V foram intensamente perseguidos e, por fim, exterminados. A pregação de Wyclif e sua tradução da Bíblia sem dúvida, prepararam o caminho para a Reforma.

João Huss, da Boêmia (nascido em 1369 e martirizado em 1445), foi um dos leitores dos escritos de Wyclif, pregou as mesmas doutrinas, e especialmente proclamou a necessidade de se libertarem da autoridade papal. Chegou a ser reitor da Universidade de Praga, e durante algum tempo exerceu influência atuante em toda a Boêmia. O papa excomungou João Huss, e determinou que a cidade de Praga ficasse sujeita à censura eclesiástica enquanto ele morasse ali. Huss, então retirou-se para lugar ignorado. Porém, de seu esconderijo enviava cartas confirmando suas idéias. Ao fim de dois anos consentiu em comparecer ao concílio da igreja católico-romana de Constança, que se realizou em Badem, na fronteira da Suíça, havendo para isso recebido um salvo-conduto do imperador Sigismundo. Entretanto, o acordo foi violado, não respeitaram o salvo-conduto sob a alegação de que "Não se deve ser fiel a hereges". Assim foi Huss condenado e queimado em 1415. Porém sua atividade e sua condenação foram elementos decisivos na Reforma de sua terra natal, e influenciaram a Boêmia, por muitos séculos, desde esse tempo.

Jerônimo Savonarola (nascido em 1452) foi um monge da Ordem dos Dominicanos, em Florença, Itália, e chegou a ser prior do Mosteiro de S. Marcos. Pregava, tal qual um dos profetas antigos, contra os males sociais, eclesiásticos e políticos de seu tempo. A grande catedral enchia-se até transbordar de multidões ansiosas, não só de ouvi-lo, mas também para obedecer aos seus ensinos. Durante muito tempo foi praticamente o ditador de Florença onde efetuou evidente reforma. Finalmente foi excomungado pelo papa. Foi preso, condenado enforcado e seu corpo queimado na praça de Florença. Seu martírio deu-se em 1498, apenas dezenove anos antes que Lutero pregasse as teses na porta da catedral de Wittenberg.

A queda de Constantinopla, em 1453, foi assinalada pelos historiadores como a linha divisória entre os tempos medievais e os tempos modernos. O Império Grego nunca se recuperou da conquista de Constantinopla pelos cruzados em 1204. Entretanto, as fortes defesas naturais e artificiais protegeram durante muito tempo a cidade de Constantinopla contra os turcos que sucederam aos árabes como poder maometano dominante. Província após província do grande império foi tomada, até ficar somente a cidade de Constantinopla, que finalmente, em 1453, foi tomada pelos turcos sob as ordens de Maomé II. Em um só dia o templo de Sta. Sofia foi transformado em mesquita (condição que perdurou até 1920) e Constantinopla tornou-se a cidade dos sultões e a capital do Império Turco. Depois da primeira guerra mundial, Ancara foi declarada a capital turca. A igreja grega continua com seu patriarca, despojado de tudo, menos de sua autoridade eclesiástica, com residência em Constantinopla (Istambul). Com a queda de Constantinopla, em 1453, terminou o período da Igreja Medieval.

Vamos mencionar, ainda que ligeiramente, alguns dos homens eruditos e dirigentes do pensamento no período que estudamos. Durante os mil anos da igreja Medieval, levantaram-se muitos homens de valor, porém somente citaremos quatro deles como dirigentes intelectuais da época.

Anselmo nasceu em 1033, no Piomonte, Itália; era um erudito, como tantos outros homens de seu tempo, que vagava por vários países. Anselmo fez-se monge do Mosteiro de Bec, na Normandia, e alcançou o cargo de abade, em 1078. Foi nomeado arcebispo de Canterbury e primaz da igreja na Inglaterra por Guilherme Rufus, em 1093. Contudo lutou contra Guilherme e contra seu sucessor Henrique I, por causa da liberdade e autoridade da igreja, e por isso foi exilado, por algum tempo. Escreveu várias obras teológicas e filosóficas, sendo por isso chamado "o segundo Agostinho". Morreu no ano 1109.

Pedro Abelardo, que nasceu no ano 1079, e morreu em 1142, como filósofo e teólogo, foi o pensador mais ousado da Idade Média. Pode ser considerado como o fundador da Universidade de Paris, que foi a mãe das Universidades européias. A fama de Abelardo, como professor, atraiu milhares de estudantes de todas as partes da Europa. Muitos dos grandes homens da geração que lhe sucedeu foram influenciados por seus pensamentos. Suas intrépidas especulações e opiniões independentes o colocaram mais de uma vez sob a expulsão da igreja. Mais famosa do que seus ensinos e escritos foi a história romântica que manteve com a formosa Eloísa, por quem deixou a vida monástica. Casaram-se, porém logo depois foram obrigados a separar-se e a entrar para conventos. Abelardo morreu no posto de abade, e Eloísa quando era abadessa.

Bernardo de Clairvaux (1090-1153) foi um nobre pertencente a uma família francesa. Educou-se para servir na corte, porém renunciou, a fim de entrar para um convento. Em 1115 fundou em Clairvaux um mosteiro da ordem dos cistercienses e foi ele o primeiro abade do convento. Essa ordem espalhou-se por muitos países e seus membros eram geralmente conhecidos como bernardinos. Bernardo era uma admirável união de pensador místico e prático. Organizou a Segunda Cruzada em 1147. Foi um homem de mente esclarecida e coração bondoso. Opunha-se à perseguição aos judeus e escrevia contra ela. Alguns de seus hinos, como "Jesus, só o pensar em ti", e ainda "Ó fronte ensanguentada", cantam-se em todas as igrejas. Somente vinte anos depois da morte foi ele canonizado como São Bernardo. Lutero declarou o seguinte: "Se houve no mundo um monge santo e temente e Deus, esse foi S. Bernardo de Clairvaux."

A mentalidade maior da Idade Média foi, sem dúvida, Tomás de Aquino, que viveu nos anos de 1225 a 1274, e foi chamado o "Doutor Universal, Doutor Angélico e Príncipe da Escolástica". Nasceu na localidade de Aquino, no reino de Nápoles. Contra a vontade da família, os condes de Aquino, entrou para a ordem dos monges dominicanos. Quando ainda estudante, Tomás era tão calado que lhe deram o apelido de "boi mudo". Mas o seu mestre Alberto Magno sempre dizia: "Um dia esse boi encherá o mundo com seus mugidos." E, de fato, ele foi a autoridade mais célebre e mais elevada de todo o período medieval, na filosofia e na teologia. Seus escritos ainda hoje são citados, principalmente pelos eruditos católicos romanos. Tomás de Aquino morreu em 1274.

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